Orfanato em Amstelveenseweg - Aldo van Eyck
Maurício Uieda

Aldo van Eyck nasceu em Driebergen em 1918. Passou sua infância na Inglaterra e depois cursou a Technische Middelbare School em Haia. Formou-se em Arquitetura pela Erdgenössische Technische Hochschule em Zurique. Foi neste período que teve contato com as vanguardas e seus integrantes como Franz Arp, Brancusi, Giacometti, Le Corbusier. Tornou-se famoso pelo seu trabalho como redator na Revista Forum (1959-1967) e por ter participado do X CIAM, onde discutiam-se novos caminhos para o pensamento arquitetônico do pós-guerra. Juntamente com outros jovens arquitetos como Herman Hertzberger e Piet Blom, van Eyck organizou um encontro na cidade de Otterlo para colocar em discussão projetos que os próprios participantes estavam desenvolvendo, com o objetivo de verificar a opinião do grupo acerca da contemporaneidade dos conceitos e valores pregados pelo Movimento Moderno.

Aldo van Eyck levou para este encontro em Otterlo o projeto do Orfantato em Amsterdã desenvolvido na segunda metade da década de 50. Ele pode ser considerado como a obra-síntese do pensamento e dos valores do arquiteto holandês pois nele pôde desenvolver em profundidade seus conceitos de claridade labiríntica e fenômenos gêmeos, que influenciaram arquitetos em todo o mundo.

árvore é folha e folha é árvore - casa é cidade e cidade é casa - uma árvore é uma árvore mas também uma grande folha - uma folha é uma folha mas também uma pequena árvore - uma cidade não é uma cidade a menos que ela seja uma grande casa - uma casa é uma casa somente se for também uma pequena cidade.

O orfanato em Amstelveensweg

"Nossa casa, de todas as vistas, tanto de dentro quanto de fora, deve ser agradável, um 'lar' para crianças. Para crianças que, por um curto ou longo tempo, ou mesmo também por alguns anos, ficarão afastadas das casas de seus pais; que sentirão saudades de seus próprios lares e para as quais nós devemos tentar amenizar esta falta. Quando uma criança chega à nossa casa ela deve ter vontade de entrar; a visão exterior deve ser atraente, convidando a criança ir para dentro." Extraído de uma carta enviada ao arquiteto pelo contratador, o diretor do orfanato Frans Meurs.
O seu diretor não queria mais um orfanato mas um espaço que fosse um Lar para estas crianças. Um lar como uma pequena comunidade, onde as crianças, os assistentes e funcionários pudessem se relacionar como uma família. Estabeleceu-se oito grupos de crianças, divididos por faixa etária: quatro grupos de crianças pequenas(0-2, 2-4, 4-6 e 6-10 anos) e mais quatro dos maiores (10-14,14-18, ambos divididos por sexo).
Cada um desses grupos possui suas necessidades funcionais e espaciais. Para tanto van Eyck alocou cada grupo estrategicamente, procurando atender especificamente cada faixa etária. Mobiliário, equipamentos e serviços foram desenhados de acordo com o grupo a que se destinam. É o caso, por exemplo, do teatro de bonecos feito para as crianças entre 10-14 anos.

teatro e
nicho de leitura

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Inbetween Spaces

Entretanto não as isolou do convívio com os outros grupos. A existência de um grupo depende da existência do outro, numa reciprocidade que se expressa principalmente nos "inbetween spaces" ou espaços de transição. Os inbetween spaces não são somente passagem entre lugares mas sim um momento onde se tem contato simultâneo com as distinções e semelhanças dos espaços por ele conectados.

"claridade labiríntica"

O edifício é modulado a partir de cubos que se aglomeram e se dispersam pelo lote. Estes volumes estão distribuídos no espaço como elementos organizadores e diferenciadores de espaços. A intenção é de criar um diálogo possível com o entorno, com a cidade existente e não a sua negação como pregava a arquitetura modernista. Van Eyck pretendia elaborar novas leituras do ambiente contruído, estabelecendo relações de escala entre pequenas e grandes estruturas componentes de um todo complexo. A este conceito deu-se o nome de claridade labiríntica (configuratie, em holandês).

 

fenômenos gêmeos - twin phenomena

Segundo Aldo van Eyck a respiração pode exemplificar seu conceito de fenômenos gêmeos: não se respira somente para fora ou somente para dentro. São fenômenos opostos mas conjugados - a existência do primeiro depende do segundo e vice-versa.
Como pólos opostos ou falsas alternativas estes antônimos abstratos possuem sempre a mesma característica: perda de identidade e seu atributo, a monotonia. Monotonia não simplesmente no sentido uniforme: se algo é demasiado e muito pouco parecido, também será demasiado e muito pouco distinto. A proporção correta florescerá tão logo os suaves ajustes de reciprocidade comecem a trabalhar neste clima de relatividade, no campo de todos os fenômenos gêmeos.
Neste projeto o arquiteto procura controlar a oposição entre conceitos como fora-dentro, interior-exterior, individualidade-coletividade, unidade-diversidade, pequeno-grande, etc. Para ele esta polarização cerrada entre os opostos não se justifica mais no mundo contemporâneo. Sua existência é simultânea e não consecutiva. Para tanto tranparências e opacidades, terraços e jardins acontecem num mesmo lugar. Ao mesmo tempo, a cada passo, a percepção das partes se faz pela compreensão do todo e vice-versa. A percepção do individual se faz pela compreensão do coletivo, e vice-versa.

 

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